sexta-feira, 8 de junho de 2012

Suavemente

Sempre teve como princípio não sentir ciúme.
Princípio, porque era quase uma filosofia. Um estilo de vida. 
Para ele, sentir ciúme de alguém era inútil, uma perda de tempo, mesquinho e  infantil.
Vez ou outra se flagrou experimentando sensações estranhas, um rascunho de raiva, um naco de inveja, uma pontada de insegurança e de medo.
Ignorou todas elas. 
Era preciso ser prático: de que adiantaria se martirizar com pensamentos de que ela poderia perceber o quanto tinha errado ao se apaixonar por ele? Ou pior: de que valeria que alimentasse a ideia de que todas as mulheres que teve, ou ainda teria, poderiam se dar conta da farsa que ele era, como amante?
Pois essa possibilidade sempre existiu, e não seria por reforçá-la com medos e paranóias que se tornaria menos plausível. 
Fez então uma escolha - muito consciente - de assumir que sim, poderia ser abandonado a qualquer momento, sim, poderiam descobrir que seus esforços nunca foram suficientes, e sim, poderia se ver, de uma hora para outra, sem a companhia dela. Sem suas risadas, sem seus olhos cor de chocolate, sem seus recados no meio do dia, sem seus beijos.
Mas, caso isso acontecesse, não enfrentaria o ridículo luto dos apaixonados. Não se permitiria mendigar afetos, não voltaria a ficar exposto.
Preferira dividir a decepção e o fracasso que poderia viver no futuro em doses homeopáticas, que ia sorvendo dia após dia.
É verdade que ainda assim a ausência dela o faria sentir saudade,  mas esta seria devidamente aplacada por cargas extras de trabalho e preocupações com a família. 
Deste modo, poupava-se da tristeza que porventura poderia sentir. 
Recusava,de antemão, tanto o ciúme, quanto o pavor que ele carrega, o medo de não ser amado.



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